sábado, 12 de novembro de 2016

Frei José de Santa Rita Durão - Arcadismo

Estrofes de "Caramuru"

CANTO I

XXIX

Barbárie foi (se crê) da antiga idade
A própria prole devorar nascida;
Desde que essa cruel voracidade
Fora ao velho Saturno atribuída:
Fingimento por fim, mas é em verdade
Invenção do diabólico homicida,
Que uns cá se matam, e outros lá se comem:
Tanto aborrece aquela fúria ao homem.

CANTO II

XXVI

Acesa luz na lôbrega caverna,
Vê-se o que Diogo ali da nau levara;
Roupas, armas, e, em partes mais interna,
A pólvora em barris, que transportara,
Tudo vão vendo à luz de uma lanterna,
Sem que o apeteça a gente nada avara,
Ouro, e prata, que a inveja não lhe atiça:
Naçao feliz! que ignora o que é cobiça.

CANTO VII

XXXI

Nas comestíveis ervas é louvada
O Quiabo, O Jiló, os Maxixeres,
A Maniçoba peitoral prezada, 
A Taioba agradável nos comeres:
O palmito de folha delicada, 
E outras mil ervas, que usar quiseres
Acharás na opulenta natureza
Sempre com mimo preparada a mesa. 
Santa Rita Durão

Análise

Acima encontramos estrofes de "Caramuru" (Poema épico do descobrimento da Bahia) que é o trabalho mais conhecido de Frei José. Essa obra é composta por 10 cantos, sendo esses divididos em estrofes que possuem 8 versos cada como podemos perceber.
A história se passa no momento em que os primeiros portugueses chegaram ao Brasil e travaram contato com os nativos: índios.
O enredo gira em torno do personagem Diogo Álvares que foi capturado juntamente com outros companheiros por uma tribo antropofágica. Porém, ao decorrer da história essa tribo é atacada por uma aldeia e Diogo se aproveita da situação, fazendo com que essa aldeia creia que ele é filho de um deus. Então ele deixa de ser prisioneiro, ganha a confiança da nova tribo, guerreia com ela e até mesmo consegue voltar a Europa para poder se casar com Paraguaçu, que era prometida a Gupeva, índio que lutou com Diogo contra a tribo que manteve o português como prisioneiro.
Características árcades nas estrofes:
Na primeira estrofe (XXIX), podemos perceber a referência feita aos valores da cultura grego-romana, em que relembra o deus do tempo, Saturno, cuja lenda diz que ele comia sua prole para que nenhum deles se tornasse deus dos deuses. O eu-lírico faz essa referência devido à antropofagia indígena.
Na segunda estrofe (XXIX), o eu-lírico ressalta a simplicidade dos índios que vivem em harmonia sem grandes bens materiais, que não sentem inveja de Diogo por ele possuir vários artefatos e outros bens. Creio que o eu-lírico sente admiração por esse povo ao dizer "Naçao feliz! que ignora o que é cobiça."
E na terceira estrofe (XXXI), notamos a valorização da natureza por conta da descrição das maravilhas naturais brasileiras.
Frei José nos mostra como o índio pode ser racionalizado, assim como aconteceu com Paraguaçu que mudou seu nome para Catarina, através da intervenção europeia, visto que não podemos nos esquecer de que o Arcadismo em si veio de um momento de mudanças como, por exemplo: a ascensão do iluminismo.

Diana Simen de Freitas



7 comentários:

  1. Concordo com a análise proposta.
    Vi que uma das mensagens que Frei José quer nos passar por "Caramuru", segundo Jacques Rousseau, é a do "bom selvagem". Na qual o índio pode ser civilizado e se tornar um "homem branco". Como ocorre com Paraguaçu, que é catequizada e muda seu nome para Catarina.
    Podemos perceber outras características árcades no texto trabalhado, além das citadas na análise. São elas: "inutilia truncat", que é a retirada dos excessos da escrita em comparação ao Barroco; "locus amoenus", que se diz respeito ao lugar ameno, o Brasil recém descoberto no caso; e "aurea mediocritas", que é a presença de um herói não monarca, como Diogo.

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  2. O poema Caramuru narra o descobrimento da Bahia, o naufrágio de Diego Álvares Correia e seus amores com as índias, sobretudo com Paraguaçu. O material é amplo:tem desde fatos da história do Brasil, o temperamento indígena, até lendas. A narrativa é enriquecida com referência a fatos históricos desde o descobrimento até a época do autor, dando-se grande relevo também à matéria descritiva e informativa. Santa Rita Durão penetra na vida do índio com intento analítico diferente do de devaneio lírico dos contemporâneos. A fantasia a que se abandona é com efeito precedida pela descrição dos costumes, das técnicas,dos ritos,tão exata quanto possível no seu tempo. Numa camada mais profunda que o nativismo e o indianismo, o que verdadeiramente anima a epopeia do frade mineiro é a sua visão do mundo,ou seja, a inspiração religiosa(religião como ideologia). Esta consiste em justificar e louvar a colonização como empresa religiosa desinteressada, trazendo a catequese para o primeiro plano e com ela cobrindo os aspectos materiais básicos. A visão laica e civil do Uraguai e dos poemas satíricos é aqui banida, fazendo do Caramuru o antagonista ideológico da melhor linha mental na literatura comum.

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  3. Concordo com sua análise, pois o poema Caramuru gira em torno da chegada dos portugueses na Bahia, mais especificamente em torno do potuguês Diego Álvares Correia que sofreu um naufrágio e foi capturado por uma tribo antropofágica.
    No poema e retratada as belezas naturais brasileiras, os hábitos indígenas e como era a visão do homem europeu sobre isso.

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  4. Concordo plenamente com a analise apresentada, nesse poema são apresentados os aspectos específicos da literatura árcade que são: Inutilia truncat, Fugere urbem, Carpe diem, Locus amoenus, Aurea mediocritas. Se vê a retirada de excessos da escrita (Inutilia truncat), fuga da cidade (Fugere urbem), na maioria das obras, essa fuga é feita para o cenário campestre, porém, em Caramuru ocorre para o ambiente indígena. Há a ideia da fugacidade do tempo, logo se procurava viver de forma mais simples, esse é o carpe diem, que na obra em questão, se refere a simplicidade indígena. Isso pode ser visto no trecho:

    “Acesa luz na lôbrega caverna,
    Vê-se o que Diogo ali da nau levara;
    Roupas, armas, e, em parte mais interna,
    A pólvora em barris, que transportara,
    Tudo vão vendo à luz de uma lanterna,
    Sem que o apeteça a gente nada avara,
    Ouro, e prata, que a inveja não lhe atiça:
    Naçao feliz! que ignora o que é cobiça.”

    Já o Locus amoenus é o conceito das imagens pastoris estabelecidas. No caso de Caramuru, o Locus amoenus pode ser o Brasil recém descoberto. Já a Aurea mediocritas é a construção de um herói que não seja monarca. O que ocorre no caso do viajante Diogo Álvares Correia.

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  5. O poema caramuru, fala a respeito da conquista da Bahia pelos portugueses, também sobre as aventuras vividas por Diogo, e de seu envolvimento com as índias e Paraguaçu com quem se casou deixando para trás Moema, que acaba se suicidando no mar. No caramuru as principais características presente são, a objetividade, idealização da mulher amada e à valorização da vida no campo.

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  6. Adorei a análise feita!
    O frei é caracterizado por apresentar em sua obra, detalhadamente, os primórdios da colonização do Brasil. Também por ser o primeiro a abordar o habitante nativo do Brasil. Sua obra apresenta uma rica descrição sobre a paisagem brasileira e sobre as guerras entre as nações indígenas.

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  7. Ficou ótimo, pessoal! Gostei muito.

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